O Senado Federal aprovou, em sessão plenária realizada em 26/04/2022, o Projeto de Lei nº 4.401/2021 (“PL 4.401/21”), que pretende constituir marco regulatório para o mercado brasileiro de ativos virtuais, categoria que inclui as criptomoedas e outros ativos digitais. O texto retorna para apreciação do plenário da Câmara dos Deputados e, caso aprovado, seguirá para sanção presidencial.
O PL 4.401/21 traz definições e diretrizes importantes, tais como (i) o conceito de ativos virtuais e de prestadores de serviços de ativos virtuais (e.g. exchanges), (ii) as atividades enquadradas como serviços de ativos virtuais e (iii) as penalidades aplicáveis para o uso de ativos virtuais visando àprática de crimes como exercício irregular dos serviços de ativos virtuais, fraude, lavagem de dinheiro, formação de pirâmides, entre outros.
O PL 4.401/21 define ativos virtuais como “a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para a realização de pagamentos ou com o propósito de investimento, não incluídos (i) moedas soberanas, (ii) moeda eletrônica, nos termos da Lei nº 12.865/2013, (iii) pontos e recompensas de programas de fidelidade, e (iv) representações de ativos com emissão, escrituração, negociação ou liquidação prevista em lei ou regulamento específico”.
Adicionalmente, o PL 4.401/21 define como prestador de serviços de ativos virtuais a “pessoa jurídica que executa em nome de terceiro pelo menos um dos seguintes serviços de ativos virtuais, quais sejam, (i) troca entre ativos virtuais e moeda nacional ou moeda estrangeira; (ii) troca entre um ou mais ativos virtuais; (iii) transferência de ativos virtuais; (iv) custódia ou administração de ativos virtuais ou de instrumentos que possibilitem controle sobre ativos virtuais; ou (v) participação em serviços financeiros e prestação de serviços relacionados à oferta por um emissor ou venda de ativos virtuais.”, e, ainda atribui competência à autoridade ou órgão da administração pública subordinada ao Poder Executivo para regulamentar e supervisionar o mercado de ativos virtuais, com poderes para estabelecer arcabouço jurídico infralegal que determine os critérios de funcionamento de prestadores de serviço virtual em território brasileiro.
Diante da ausência de designação explícita de autoridade reguladora dos ativos virtuais, é esperado que tal competência seja atribuída ao Banco Central do Brasil (“BCB”), em virtude de sua atuação no setor por meio de iniciativas situadas sob o guarda-chuva da chamada Agenda BC#, dentre as quais a criação do Real Digital, na forma de uma Central Bank Digital Currency.
Conforme o Art. 7º do PL 4.401/21, competirá ao regulador indicado em ato do Poder Executivo Federal (i) autorizar funcionamento, transferência de controle, fusão, cisão e incorporação da prestadora de serviço de ativos virtuais, (ii) estabelecer condições para o exercício de cargos em órgãos estatutários e contratuais em prestadora de serviço de ativos virtuais e autorizar a posse e o exercício de pessoas para cargos de administração, (iii) supervisionar a prestadora de serviço de ativos virtuais e aplicar as disposições da Lei nº 13.506, de 13 de novembro de 2017, em caso de descumprimento do PL 4.401/21 ou de sua regulamentação, (iv) cancelar ou suspender, mediante processo administrativo com o devido processo legal, as autorizações de que se trata os itens “i” e “ii” acima, ressalvadas as garantias constitucionais de todos os envolvidos, (v) dispor sobre as hipóteses em que as atividades ou operações de que trata o art. 3º do PL 4.401/21 serão incluídas no mercado de câmbio ou em que deverão se submeter à regulamentação de capitais brasileiros no exterior e capitais estrangeiros no País.
O PL 4.401/21 dispõe, também, que as instituições autorizadas a funcionar pelo BCB poderão prestar exclusivamente o serviço de ativos virtuais, ou cumulá-lo com outras atividades, na forma da regulamentação a ser editada por órgão ou entidade da Administração Pública Federal indicada em ato do Poder Executivo Federal.
O PL 4.401/21 estabelece, ainda, em seu texto, segregação patrimonial dos recursos financeiros, ativos virtuais e respectivos lastros de titularidade própria daqueles detidos por conta e ordem de terceiros, bem como estipula que tais recursos, ativos e lastros não respondem, direta ou indiretamente, por nenhuma obrigação dos prestadores de serviço de ativos virtuais, não podendo ser objeto de arresto, sequestro, busca e apreensão ou qualquer outro ato de constrição judicial em função de responsabilidade de tais pessoas jurídicas.
O órgão regulador a ser definido pelo Poder Executivo Federal estabelecerá condições e prazos, não inferiores a 6 (seis) meses, para adequação das prestadoras de serviços de ativos virtuais que estiverem em atividade às novas normas.
Adicionalmente, serão aplicadas às operações conduzidas no mercado de ativos virtuais, no que couber, as disposições da Lei n º 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor).
No que tange ao direito penal, o PL 4.401/21 propõe alterações no Decreto-Lei nº 2.848/40 (Código Penal), na Lei nº 7.492/86 (Lei de Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional) e na Lei nº 9.613/98 (Lei de Lavagem de Dinheiro), de modo a coibir o uso de ativos virtuais para crimes de fraude, ocultação de bens e lavagem de dinheiro.
Em matéria de direito tributário, o PL 4.401/21 propõe a concessão de isenção fiscal de PIS, Cofins, IPI e II sobre a aquisição de máquinas e software utilizadas para processamento, mineração e preservação de bens virtuais por pessoas jurídicas até 31 de dezembro de 2029. Referida isenção, no entanto, está condicionada ao uso de 100% da energia elétrica utilizada originária de fontes renováveis, bem como à neutralização equivalente das emissões de gases de efeito estufa (GEE) oriundas dessas atividades.
Cumpre ressaltar que o PL 4.401/21 excluiu expressamente do rol de ativos virtuais todos os ativos representativos de valores mobiliários, sujeitos ao regime específico da Lei nº 6.385/76 (“Lei de Valores Mobiliários”), em virtude do disposto no Art. 2º, inciso IX da referida Lei e em linha com a jurisprudência estabelecida pela Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), especialmente aqueles enquadrados com base no chamado “Howey Test”, desenvolvido pela Suprema Corte dos EUA para enquadrar ativos na condição de valores mobiliários sob a designação de contratos de investimento coletivo.
Por oportuno, vale mencionar que a tokenização de bens, dentre elas a tokenização de direitos creditórios e imóveis, assunto que vem sendo amplamente discutido, poderia estar excluída da definição de ativos virtuais prevista no PL 4.401/21, na medida em que esses tokens podem vir a ser “representações de ativos cuja emissão, escrituração, negociação ou liquidação esteja prevista em lei ou regulamento”. Ademais, direitos creditórios e imóveis tokenizados poderão ser considerados asset tokens, porquanto constituem representações de ativos físicos que podem ser transacionados por meio de blockchain, que asseguram aos seus titulares determinados direitos decorrentes dos ativos lastro, tais como direitos de participação ou de remuneração. Logo, quando ofertados publicamente, esses asset tokens podem representar contratos de investimento coletivo.
A aprovação do PL 4.401/21 é esperada diante da necessidade de adequação regulatória deste mercado, de modo a gerar previsibilidade e segurança a todas as partes operantes no setor de ativos virtuais.
Acesse o texto aprovado pelo Senado Federal aqui.
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